Coletivo entrevista autor de manifesto anti-orkut.Por Coletivo AMPT. 24/02/2006 às 17:47
O coletivo Arte Magia Política e Técnica, intrigado com a repercussão do manifesto que, surgido no interior do famigerado Orkut, propõe um “suicídio ritual coletivo” de seus membros, buscou o autor do imperativo “DESORKUTE-SE!”. A análise desse fenômeno, notadamente debordiana, revela a importância do autor francês na análise das atuais manifestações objetivas do espetáculo moderno, objeto de estudo do coletivo. Recusa tecnológica, plágio, subversão entre outros temas foram também discutidos pelo autor do manifesto.
(...) ( parte II) Coletivo AMPT: Mas entremos agora no motivo de nossa conversa, o que o senhor pretende com seu manifesto “DESORKUTE-SE!”? EB: Costumo dizer que minha única pretensão é não ter pretensões, não gosto de criar espectativas em torno de nada, faço o que posso pra estimular as pessoas a saírem da inércia e da alienação extremas em que se encontram hoje, mas não tenho esperança (nem espero) que as coisas mudem, nem espero também que haja um suicídio ritual em massa dentro do Orkut. Dessa maneira não falho em meu intuito, que é simplesmente buscar uma contrareferência àquelas postas pelo espetáculo, busco apenas um despertar para o processo de reflexão crítica diante de instrumentos vazios como o Orkut. Não tenho o objetivo de atingir a massa, até porque ela é brutalmente excluída tecnologicamente, escrevo de forma até incompreensível para um grande número de pessoas que nunca tomaram contato com os conceitos debordianos de separação e espetáculo por exemplo, mas deixo da forma mais clara possível a prática que decorre de um manifesto à primeira leitura um tanto quanto pedante e incompreensível, desorkute-se! é isso que vale de fato. Fomos criados por uma mídia particularizada e especializada que veicula informações e imagens de maneira fragmentada ao espectador moderno, lemos na verdade, apenas o enunciado das questões, a manchete das notícias, e na realidade as próprias notícias não acrescentam muito ao que dizem suas manchetes, vivemos o tempo da superficialidade e aparência totais. A publicidade digere e cospe aos consumidores séculos de filosofia todos os dias pela tv e é dessa forma que estamos acostumados a assimilar os elementos de nossas vidas. Coletivo AMPT: Acha mesmo que o imperativo DESORKUTE-SE! contém todo o pensamento expresso no manifesto? EB: Não é exatamente isso que disse, ele não contém, mas chama o leitor crítico a tomar contato com o que escrevi. Existem pessoas críticas na falsa realidade do Orkut, participei de algumas comunidades aproveitáveis, e o manifesto soa como um tapa na cara dessas pessoas, e são elas aquelas que não irão desorkutar-se justamente porque entraram para a “rede de amigos separados” sabendo de suas limitações e perigos. É uma questão de escolha. Acredito que a maioria das pessoas que de fato se desorkutaram ao entrar em contato com o manifesto o fizeram mais pelo imperativo “desorkute-se!” do que pelo manifesto em si, conheço pessoas que se reterritorializaram (termo que designa o resultado do ato de suicídio do Orkut) e nem leram o manifesto por inteiro, aliás nem concordam com algumas idéias específicas do texto, um amigo meu disse que desorkutou depois de perceber que existiam pessoas fazendo isso por recusa, e que existia até um manifesto embasando “teoricamente” o ato! (risos). Agora, voltando ao que dizia sobre a publicidade, a Coca-Cola está veiculando na mídia seu novo slogan, ele diz algo como “a vida é você quem faz”. De forma cruel, esses publicitários filhos da puta estão absorvendo todo o conteúdo subversivo da ontogênese pessoal, aliás a Sprite também se utiliza desse estratagema ao bradar “Liberte-se da sede!”, assim como o fazem também o Master Card entre outros (muitos). Nessa propaganda que comentei, da Coca, a subjetividade do indivíduo é estimulada, e não de maneira individualista burguesa, como poderiam dizer alguns, mas é estimulada justamente em seu oposto: pregam-se a negação do trabalho (risos) e a mudança radical de seu estilo de sobre-vida, aspectos ainda herdados da contracultura. Então vejam, o símbolo mercadológico mais emblemático do sistema capitalista estimulando a “negação do trabalho”, e regurgitando Nietzche para as massas! A indústria da falsa-consciência se faz presente subvertendo a subversão! O homem espectador absorve então toda a mensagem fragmentada pela publicidade e vai ao supermercado mais próximo matar sua sede fetichizada. Afinal, todos queremos negar o trabalho, e o espetáculo nos faz acreditar que esse ato é obra somente de uma ficção, ou de uma propaganda de refrigerantes. Iludidos, consumimos, e é mais ou menos isso que busco também em meu manifesto, fazer as pessoas acreditarem que é possível viver sem o Orkut, e que as relações com o cotidiano são muito mais interessantes do que as relações com o cotidiano-rede. Coletivo AMPT: O que é cotidiano-rede? EB: É um conceito que estou ainda trabalhando, o cotidiano-rede é a inversão do cotidiano real, e ao mesmo tempo sua complexificação. Há muito não rompemos com nosso cotidiano, não nos apropriamos nem dominamos de fato, seu espaço. Não reconhecemos nem temos consciência de seu território, de sua esfera de ação, mas não o fazemos porque também há muito fomos transformados em objeto, e dessa forma não nos sentimos capazes de transformar a realidade em que vivemos. No cotidiano-rede, o indivíduo já objetivizado se insere em um universo falso, aquilo que chamei de “território de ilusões” e dessa forma transforma-se em fluxo informacional, um dado na web. O indivíduo espectador em suas relações com a territorialidade reproduz sua conduta no espaço desterritorializado da rede, e no Orkut, um mecanismo de controle da contra-web, participa passivamente de uma outra esfera de não-realização, essa já objetivada: o cotidiano-rede. Ele é portanto, a objetivação do indivíduo separado de cotidiano territorializado, através da rede informacional desterritorializada. É, ficou confuso ainda (risos). Coletivo AMPT: Como se dá o processo de “reterritorialização”? EB: A desterritorialização é um processo específico das redes tecnológicas e informacionais, significa algo como “ausência de território”, ou um complexo de pontos, linhas e fluxos que se cruzam através das redes. O Orkut é um exemplo claro de desterritorialidade, o problema maior que encontro nisso é sua objetivação. Estamos perdendo tempo no espaço ilusório e ausente de realização, sua objetivação se dá na medida em que vivemos sua representação e acreditamos (falsamente) saber desassociar uma coisa da outra, mentira! A reterritorialização é o processo de retorno à esfera real de nossas vidas, àquela realidade com a qual ainda não sabemos lidar, e ao invés de encara-la com criatividade, desejo e fantasia, procuramos fugir dela, seja em frente à TV, seja no Orkut, ou ainda andando pelas ruas sem observar o seu entorno, como se seu campo de visão fosse limitado ao tamanho da tela de TV (que nos criou). Precisamos dominar, obter consciência de nosso território e não utiliza-lo de maneira inerte e imbecilizada como o fazemos, indo da casa pro trabalho, do trabalho para a faculdade, da faculdade para a casa, sempre seguindo os mesmos caminhos, conduta padronizada de indivíduos cegos de tanto ver imagens e não enxerga-las além de qualquer coisa que não sejam apenas imagens.
Email:: coletivoampt
O coletivo Arte Magia Política e Técnica, intrigado com a repercussão do manifesto que, surgido no interior do famigerado Orkut, propõe um “suicídio ritual coletivo” de seus membros, buscou o autor do imperativo “DESORKUTE-SE!”. A análise desse fenômeno, notadamente debordiana, revela a importância do autor francês na análise das atuais manifestações objetivas do espetáculo moderno, objeto de estudo do coletivo. Recusa tecnológica, plágio, subversão entre outros temas foram também discutidos pelo autor do manifesto.
(...) ( parte II) Coletivo AMPT: Mas entremos agora no motivo de nossa conversa, o que o senhor pretende com seu manifesto “DESORKUTE-SE!”? EB: Costumo dizer que minha única pretensão é não ter pretensões, não gosto de criar espectativas em torno de nada, faço o que posso pra estimular as pessoas a saírem da inércia e da alienação extremas em que se encontram hoje, mas não tenho esperança (nem espero) que as coisas mudem, nem espero também que haja um suicídio ritual em massa dentro do Orkut. Dessa maneira não falho em meu intuito, que é simplesmente buscar uma contrareferência àquelas postas pelo espetáculo, busco apenas um despertar para o processo de reflexão crítica diante de instrumentos vazios como o Orkut. Não tenho o objetivo de atingir a massa, até porque ela é brutalmente excluída tecnologicamente, escrevo de forma até incompreensível para um grande número de pessoas que nunca tomaram contato com os conceitos debordianos de separação e espetáculo por exemplo, mas deixo da forma mais clara possível a prática que decorre de um manifesto à primeira leitura um tanto quanto pedante e incompreensível, desorkute-se! é isso que vale de fato. Fomos criados por uma mídia particularizada e especializada que veicula informações e imagens de maneira fragmentada ao espectador moderno, lemos na verdade, apenas o enunciado das questões, a manchete das notícias, e na realidade as próprias notícias não acrescentam muito ao que dizem suas manchetes, vivemos o tempo da superficialidade e aparência totais. A publicidade digere e cospe aos consumidores séculos de filosofia todos os dias pela tv e é dessa forma que estamos acostumados a assimilar os elementos de nossas vidas. Coletivo AMPT: Acha mesmo que o imperativo DESORKUTE-SE! contém todo o pensamento expresso no manifesto? EB: Não é exatamente isso que disse, ele não contém, mas chama o leitor crítico a tomar contato com o que escrevi. Existem pessoas críticas na falsa realidade do Orkut, participei de algumas comunidades aproveitáveis, e o manifesto soa como um tapa na cara dessas pessoas, e são elas aquelas que não irão desorkutar-se justamente porque entraram para a “rede de amigos separados” sabendo de suas limitações e perigos. É uma questão de escolha. Acredito que a maioria das pessoas que de fato se desorkutaram ao entrar em contato com o manifesto o fizeram mais pelo imperativo “desorkute-se!” do que pelo manifesto em si, conheço pessoas que se reterritorializaram (termo que designa o resultado do ato de suicídio do Orkut) e nem leram o manifesto por inteiro, aliás nem concordam com algumas idéias específicas do texto, um amigo meu disse que desorkutou depois de perceber que existiam pessoas fazendo isso por recusa, e que existia até um manifesto embasando “teoricamente” o ato! (risos). Agora, voltando ao que dizia sobre a publicidade, a Coca-Cola está veiculando na mídia seu novo slogan, ele diz algo como “a vida é você quem faz”. De forma cruel, esses publicitários filhos da puta estão absorvendo todo o conteúdo subversivo da ontogênese pessoal, aliás a Sprite também se utiliza desse estratagema ao bradar “Liberte-se da sede!”, assim como o fazem também o Master Card entre outros (muitos). Nessa propaganda que comentei, da Coca, a subjetividade do indivíduo é estimulada, e não de maneira individualista burguesa, como poderiam dizer alguns, mas é estimulada justamente em seu oposto: pregam-se a negação do trabalho (risos) e a mudança radical de seu estilo de sobre-vida, aspectos ainda herdados da contracultura. Então vejam, o símbolo mercadológico mais emblemático do sistema capitalista estimulando a “negação do trabalho”, e regurgitando Nietzche para as massas! A indústria da falsa-consciência se faz presente subvertendo a subversão! O homem espectador absorve então toda a mensagem fragmentada pela publicidade e vai ao supermercado mais próximo matar sua sede fetichizada. Afinal, todos queremos negar o trabalho, e o espetáculo nos faz acreditar que esse ato é obra somente de uma ficção, ou de uma propaganda de refrigerantes. Iludidos, consumimos, e é mais ou menos isso que busco também em meu manifesto, fazer as pessoas acreditarem que é possível viver sem o Orkut, e que as relações com o cotidiano são muito mais interessantes do que as relações com o cotidiano-rede. Coletivo AMPT: O que é cotidiano-rede? EB: É um conceito que estou ainda trabalhando, o cotidiano-rede é a inversão do cotidiano real, e ao mesmo tempo sua complexificação. Há muito não rompemos com nosso cotidiano, não nos apropriamos nem dominamos de fato, seu espaço. Não reconhecemos nem temos consciência de seu território, de sua esfera de ação, mas não o fazemos porque também há muito fomos transformados em objeto, e dessa forma não nos sentimos capazes de transformar a realidade em que vivemos. No cotidiano-rede, o indivíduo já objetivizado se insere em um universo falso, aquilo que chamei de “território de ilusões” e dessa forma transforma-se em fluxo informacional, um dado na web. O indivíduo espectador em suas relações com a territorialidade reproduz sua conduta no espaço desterritorializado da rede, e no Orkut, um mecanismo de controle da contra-web, participa passivamente de uma outra esfera de não-realização, essa já objetivada: o cotidiano-rede. Ele é portanto, a objetivação do indivíduo separado de cotidiano territorializado, através da rede informacional desterritorializada. É, ficou confuso ainda (risos). Coletivo AMPT: Como se dá o processo de “reterritorialização”? EB: A desterritorialização é um processo específico das redes tecnológicas e informacionais, significa algo como “ausência de território”, ou um complexo de pontos, linhas e fluxos que se cruzam através das redes. O Orkut é um exemplo claro de desterritorialidade, o problema maior que encontro nisso é sua objetivação. Estamos perdendo tempo no espaço ilusório e ausente de realização, sua objetivação se dá na medida em que vivemos sua representação e acreditamos (falsamente) saber desassociar uma coisa da outra, mentira! A reterritorialização é o processo de retorno à esfera real de nossas vidas, àquela realidade com a qual ainda não sabemos lidar, e ao invés de encara-la com criatividade, desejo e fantasia, procuramos fugir dela, seja em frente à TV, seja no Orkut, ou ainda andando pelas ruas sem observar o seu entorno, como se seu campo de visão fosse limitado ao tamanho da tela de TV (que nos criou). Precisamos dominar, obter consciência de nosso território e não utiliza-lo de maneira inerte e imbecilizada como o fazemos, indo da casa pro trabalho, do trabalho para a faculdade, da faculdade para a casa, sempre seguindo os mesmos caminhos, conduta padronizada de indivíduos cegos de tanto ver imagens e não enxerga-las além de qualquer coisa que não sejam apenas imagens.
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